sábado, 9 de junho de 2012




TRANSFORMAR

 Protocolo sobre Pina Bausch, feito por Marcelo Braga 




Depois dos primeiros passeios por entre as obras de Pina Bausch, TRANSFORMAR foi a primeira palavra que me veio a cabeça.... suas criações são de um forte impacto visual e auditivo e se assemelham ao uma viagem imagética e sensorial que fica impressa no corpo de quem trava contato com elas.
O universo da tanztheater, ou dança teatro, que encontrei ao lançar um olhar mais apurado sobre os espetáculos dos bailarinos de Wuppertal estava muito distante daquele universo idealizado da dança e muito mais próximo de mim – encontrei ali retratadas as “relações humanas básicas de pessoas ditas normais”.

O simples transformado em inusitado!!!


AS PALAVRAS SÓ PODEM EVOCAR AS COISAS... DEPOIS VEM A DANÇA



Na nossa primeira tarefa, que era resgatar imagens/movimentos da obra de Pina Bausch para compartilhá-los em sala de ensaio, encontrei certa dificuldade em escolher o que levar pelo fato de que eu ficava sempre buscando um significado para aquele movimento escolhido... a medida que esse exercício de observação/apreensão/compreensão foi acontecendo  pude perceber que as palavras eram insuficientes para nominar os movimentos e que, na verdade, a lógica era ao contrário: as palavras servem para inicialmente nominar as coisas mas que o movimento humano é capaz de ampliar essas palavras conferindo-lhes significados mais amplos.

CRIAR UM VOCABULÁRIO CORPORAL

Na primeira experiência como ator-bailarino, seguida do contato/observação/estudo de alguns espetáculos de Pina Bausch, minha preocupação foi: Como me expressar pelo corpo, sem a palavra? Será que meu colega/coreógrafo vai entender aquilo que estou querendo dizer?  Ao final da primeira experiência percebi que foi a prática conjunta que foi capaz de criar um vocabulário corporal comum e compreensível. No meu caso, um gesto de arrumar meu anel para continuar a criar o meu repertório corporal – aquele gesto que eu “absolutamente” não dei foco – foi o gesto escolhido e que acabou por determinar o início da criação de uma outra gama de movimentos delicados, pequenos e não menos expressivos.




RELATAR SITUAÇÕES QUE TE DEIXAM SEM PALAVRAS

Na minha primeira experiência como coreógrafo a sensações geradas pelo processo criativo foram opostas aquelas do processo como ator bailarino. Minha função era observar/absorver/organizar um conjunto de movimento e expressões de um coletivo de atores bailarinos. Pensei que minha experiência na direção teatral seria suficiente para realizar tal tarefa.... me enganei... no início busquei registrar cada momento relevante de cada um dos meus atores bailarinos. Depois de algum tempo percebi que meu registro precisava ser mais amplo pois os movimentos/partituras que estavam sendo apresentadas a mim eram fruto das experiências pessoais daqueles atores bailarinos. 



Percebi então que está ali, diante de mim, UMA NOVA MANEIRA DE EXPRESSÃO, uma representação da realidade de cada um a partir da sua percepção da pergunta que eu fiz para provocá-los cenicamente -PERGUNTAS PODEM LEVAR A RESPOSTAS CÊNICAS. Uma maneira que “dançateatraliza” a realidade sem se afastar dela e sem também pretender trazê-la fielmente para o palco.




RETRATAR A PALAVRA COM O CORPO

Como dizer o que penso através do corpo, deixando para a palavra só o essencial? Essa foi a minha pergunta norteadora durante todo o experimento Pina Bausch!!! Pude perceber, enquanto coreografo, que quanto o uso da palavra foi permitido esse limite da “palavra essencial” foi pouco explorado e muito pouco compreendido. Como saber se o gesto está ou não dando conta? Como perceber onde cabe e onde não cabe a palavra?



CONSTRUÇÃO CORPORAL DO SENTIMENTO/ TORNAR “EXTERIOR” O QUE É “INTERIOR”.




O experimento Pina Bausch foi importante para que eu pudesse ampliar minha percepção da palavra EXPRESSÃO. A busca de trazer a cena um sentimento genuíno e ao mesmo tempo teatral é uma das minhas buscas mais significativas como artista/pedagogo de teatro. Evidentemente que o universo das artes cênicas nos apresenta uma diversidade de possibilidades de expressão mas o contato mais íntimo e constante com o universo da tanztheater foi capaz de potencializar a minha compreensão.


"DANÇA É VISTA COMO UM EXTRAVASAMENTO DE SENTIMENTOS INTUITIVOS OU INCONSCIENTES, INACESSÍVEIS A EXPRESSÃO VERBAL."[1]




[1] Reading Dancing – Bodies Subjectas in Contemporary American Dance (Berkeley: University of California Press, 1986), p. xiv.

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