O Homem e o Mundo: Algumas categorias relacionais
Quando comecei a participar do módulo Pina Bausch, eu apenas conhecia alguns trabalhos da coreógrafa, porém tudo foi sempre muito distante. Sinceramente, eu somente havia assistido ao novo filme "Pina 3D" de Win Wenders e conhecia algumas informações pouco conexas.
Como sou das artes plásticas, não sabia a fundo sobre os
procedimentos estéticos que geravam os movimentos das coreografias de Pina.
Encontrei nas práticas das aulas um campo difícil de se envolver, pois me
exigia um desapego com relação a meu próprio corpo, algo que nunca ninguém
havia me exigido ou mesmo proposto. O pouco que sei hoje sobre os movimentos de
Pina, foram inicialmente descobertos nestas aulas.
Na
primeira aula do módulo, sugeriu-se levar um movimento de Pina Bausch para a
dinâmica prática coletiva e contextualizá-la, além disso também pediu-se que
fosse criada uma pequena cena de múltiplos movimentos a partir de uma pergunta subjetiva
movente, assim como os processo estéticos reais de Pina.
Até
então, eu desconhecia o fato de que as perguntas eram conseqüências moventes
para a geração dos movimentos de dança dos atores nas coreografias. As "perguntas",
como um processo estético extremamente forte e definido, gerava uma
multiplicidade de reações que tornavam o movimento gerado por cada ator, um
elemento parcial, diferente, subjetivo, pessoal e intuitivo.
Desde
que me dei conta do valor que as perguntas tinham para a "elaboração"
ou "surgimento
espontâneo" de cada movimento, fiquei bastante intrigada.Em realidade, falo aqui sobre o ponto que mais me desapontou
curiosidade dentro do bloco das aulas de Pina Bausch: creio que até agora as
questões que permeiam os assuntos sobre esta "pergunta geradoras" são
os conteúdos que aqui mais me fazem re-pensar a estética usada por ela.
Na segunda aula do módulo, tivemos a oportunidade de assistir na integra ao filme "O lamento da Imperatriz" de direção da própria coreografa. o Filme, tema de nosso trabalho prático final, tornou meu interesse sobre o processo estético de "perguntas" de Pina bausch, ainda mais forte.
A seguir
desenvolverei uma pequena análise sobre alguns pontos do filme que julgo importantes,
para estabelecer relações entre as perguntas, respostas e movimentos que vemos
na obra de Pina Bausch.
Lembro-me
que quando terminei de ver o filme "O Lamento da Imperatriz" percebi que havia
esquecido completamente que o processo estético inicial das perguntas e respostas
estavam embutidos nos movimentos cênicos presentes no filme. Realmente
acreditei durante todo o tempo que os movimentos eram extremamente copiados,
encenados, ensaiados, ditados, tecnicamente testados, direcionados, dirigidos e
pensados racionalmente para cada atuação.
Após
o término do Filme, quando fizemos o debate sobre nossas impressões principais,
notei que todos falavam sobre o quanto as perguntas de Pina eram importantes
para desempenhar aqueles movimentos e como todos viam uma real correlação entre
a subjetividade da resposta da pergunta e a particularidade sentimental de cada
resposta/movimento.
Infelizmente
ou felizmente, fiquei um pouco assustada com a reação das pessoas, pois notei ali
que talvez eu não havia entendido absolutamente nada do que vi. Eu acreditava
de "corpo e alma" que enquanto eu via o Filme, tudo aquilo era
dramatizado intencionalmente e extremamente calculado somente por Pina. Ou não
era?
Por
outro lado, parei para questionar um pouco sobre os objetivos narrativos intrínsecos
ao filme, até que ponto Pina Bausch com um processo estético tão peculiar e subjetivo,
não mostrava a uma aluna inicialmente na teoria do teatro, um filme calculado,
racional intencional e necessário?
Para
fundamentar um pouco desta minha visão, citarei algumas passagens do filme,
colocando em seqüência frames que
ilustrem meus pensamentos. Antes de iniciar, entretanto, a passagem e
análise das imagens, falarei sobre alguns princípios ou aspectos que notei na
narrativa de "O Lamento da Imperatriz" que me fizeram entender o
filme desta maneira.
Basicamente
ao longo do filme notei alguns aspectos fundamentais (que apresento em 4 cenas
localizadas) que fazem parte do roteiro da coreografa/diretora: O HOMEM, a MAQUINA
e os OBJETOS se apresentam como elementos primeiros ao se relacionarem com 2
naturezas cenográficas reais do MUNDO. Para o entendimento dessas cenografias
reais, neste caso, nota-se: o CENARIO URBANO e o CENARIO NATURAL. Ambos
explorados no máximo de suas potencialidades (som e imagem como ação e como representação).
Neste
caso, notei especificamente, que os aspectos que existem dentro deste cenário
do Mundo: máquina, homem e objeto, se entrelaçavam e relacionavam-se entre si,
ora a ora, trocando de postos, invertendo papéis, gerando forças e igualando
suas energias.
Podemos notar por exemplos uma troca de necessidades,
tentativas de ser o que não se é, ser algo que sabemos que não podemos ser,
pois cada parte do mundo está inserida em seu contexto que muitas vezes,
primitivamente, são totalmente imutáveis.
"As
plantas não falam, não ouvem, não sei. Os animais não entendem sobre desavenças
amorosas, não podem escutar uma embriaguez. não sei. A criança não pode voar,
mas voam. O som da cidade é maior que o som de um violino?" Pergunto eu.
Nota-se
no filme uma tentativa de troca de tipos no mundo, deslocamentos de ação e
percepção, que ainda que sejam característicos dos processos estéticos de Pina
Bausch, lidam com o tempo e o espaço de nossa própria realidade, seja ela atual
ou anciã.
Breve
Análise de Cenas escolhidas:
*Cena1:Vemos uma
cena em que um homem percorre um campo carregando um armário pelas costas como
um casco. O peso do objeto inanimado, sem aparentemente nenhuma ameaça ou
reação, é capaz quase intencionalmente de derrubá-lo, jogá-lo para fora do seu
eixo humano, deixando-o de quatro como um bicho. Quem vence? é uma disputa?
quem pensa? quem reage? o homem ou seu casco inanimado?
*Cena 2: Vemos uma
mulher embriagada, notadamente decepcionada, conturbada, frustrada, louca, a
desejar dividir suas angustias com o rebanho. Ela oferece a bebida, mas as ovelhas
parecem não perceber. Ela grita, mas as ovelhas parecem não escutar, onde está
a percepção das ovelhas, porque não escutam essa mulher?
*Cena 3: A criança
na corda, sendo erguida por um homem qualquer, a criança oscila de um lado para
o outro, ela se ergue na corda, ela voa. Esse voô é duro, firme, ele me lembra
uma forca, uma prisão. O oposto da liberdade?
*Cena 4: A cidade
e o metro, o violino, o barulho, o barulho da cidade e da máquina, da máquina,
a máquina é a cidade. Qual o papel do som do movimento em Pina Bausch? O som da
vídeo na minha opinião é tão importante quanto o movimento do vídeo. E
fundamental.
Conclusão:
Descrever algumas cenas do filme de Pina Bausch me faz pensar nos diversos procedimentos estéticos englobados em toda a pesquisa da coreografa, é inegável inferir um ou outro aspecto performático como principal ou definível de seu processo.
Noto
entretanto, que os processos estéticos (muitos dos falados e apontados em aula
e que eu nem citei aqui) são nada mais que uma constatação real do mundo em que
se vive: contradições de espaços, tempos e deslocamentos que encontramos ao por
os pés para fora de casa ou até mesmo e principalmente dentro dela.
Não
há como pensar Pina Bausch sem pensar em nós mesmos, nossa existência, nossas
falhas e contradições. O mundo e sua mescla de elementos existententes
contrariamente uns aos outros são de todo modo um grande absurdo, assim como os
arquétipos propostos na obra de Pina.
Sinto
que apesar de entender todo o processo estético de perguntas e respostas e
notar nelas uma grande subjetividade do movimento de cada resposta-ator, noto
também e principalmente, que Pina é uma grande e racional propositora de questões
fundamentais humanas, todas elas muito controladas, minuciosamente encenadas,
tecnicamente apuradas e principalmente objetivas e intencionais. Por que não?
Trabalho Prático Final apresentado para o curso. Frames do Vídeo/ referência " O Lamento da Imperatriz" de Pina Bausch.